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A Armadilha do Crediário

A expansão do crédito para pessoas físicas e o crescimento das ­vendas a prazo tem aumentado a inadimplência. Aparentemente, nunca foi tão fácil comprar a prazo e/ou obter empréstimo.

 

Só que além das taxas de ­juros muito superiores à inflação, o consumidor vai pagar acréscimos legalmente previstos, como o IOF – Imposto Sobre Operações Financeiras – e a taxa de serviço da financiadora que, na prática, funciona como uma taxa de juros adicional. 

 

Sem falar, é claro, que a média de juros em um mês pode ser superior à inflação de um ano inteiro. Exemplo: Segundo o Dieese, a inflação em maio foi de 0,22%. Já a taxa média para o cheque especial no mesmo mês, levantada pelo Procon, ficou em 9,49%.

 

Além dos juros, o sistema bancário ainda impõe pesadas tarifas.

 

A professora de matemática Maria de Fátima * é uma das vítimas dessa política; mesmo  depois de ter resgatado e quitado, com juros e correção monetária, 7 cheques que haviam sido devolvidos, Maria de Fátima ainda precisa pagar R$ 22,00 para reapresentar cada cheque ao banco. “Paguei minhas dívidas com juros altíssimos e honorários de advogado, mas ainda não retomei meu limite de crédito no cheque especial por causa dessas tarifas”, lamenta a professora.

 

Por que mesmo os consumidores informados são enganados na hora do financiamento.

 

Uma pesquisa realizada pela Anefac – a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade – em março revela que 76% dos anúncios não dão destaque à taxa de juros praticada nas vendas a prazo.

 

Pior ainda, 36% dos anúncios que informam a taxa dão a informação errada, apresentando um valor inferior ao efetivamente praticado. A engana­ção ocorre apesar de o Código de Defesa do Consumidor determinar que, quando o preço à vista é diferente do total a prazo, a loja tem que informar em destaque a taxa de juros que esta praticando.

 

Muitas vezes, os próprios consumidores contribuem com a armadilha. De acordo com o economista e vice-presidente da Anefac, Miguel José ­Ribeiro de Oliveira, a maioria dos ­consumidores entra em um financiamento sem saber qual é a taxa embutida nos mesmos e se ela é elevada ou não. “Os consumidores preocu­pam-se apenas com o valor da prestação”, esclarece o economista.

 

Como funciona a política de juros depois do Real.

Quem cede às tentações do financiamento, não pode nem reclamar: o Procon não tem como acatar denúncias contra juros altos, porque a Constituição garante uma política de mercado no setor financeiro, com juros livres.

 

Sem saber, você pode estar contribuindo indiretamente com a velha mentalidade inflacionária. Veja como ela funciona no Brasil Pós Real:

 

Muitos compradores apelaram ao CDC – o Crédito Direto ao Consumidor – no último Natal, para a compra de DVDs, televisores com tela plana e celulares, os sonhos de consumo desta nova época. Poucas vezes o comércio obteve lucros tão elevados: a venda a prazo passou a ser um negócio tão bom, que as lojas chegam a ganhar mais com os financiamentos, do que com a venda de seus produtos.

 

Com isso, o crescimento da renda pós-real foi engolido pelos elevados juros praticados no crediário. Juros que transferem renda dos mais pobres para os mais ricos e que garantem o sucesso de bancos, empresas de crédito pessoal e agiotas. Se você está em débito com o cheque especial ou cartão de crédito, por exemplo, sua dívida cresce cerca de 10% ao mês. É uma roda-viva que pode levar o consumidor a dever cada vez mais e eles, a faturarem. O crédito ou empréstimo é como se fosse um outro produto. Um produto extremamente rentável, é importante dizer. Segundo a Anefac, os bancos, por exemplo, têm 28% de lucro sobre os empréstimos pessoais e inacreditá­veis 43% de lucro sobre a utilização do limite do cheque especial.

 

O professor Antônio * teve que usar esse produto – empréstimo bancário – para terminar de pagar seu curso de História na PUC. O crédito educativo, adquirido em 92 e renegociado em 98, transformou-se em uma dívida inacreditável: Antônio Aquino deve ainda hoje R$ 3.260,00 para a Caixa Econômica Federal. “Desse total, cerca de R$ 2.880,00 são de correção monetária, juros e seguro. Dívida mesmo é só R$ 383,17”, explica o professor.


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