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Medo da Inadimplência Derruba Crediário

Combinação de juros altos e desemprego leva comércio a privilegiar pagamento à vista

 

Bancos, lojas, financeiras e consumidores já começaram a erguer as trincheiras para evitar o crescimento desenfreado da inadimplência diante da economia desaquecida, com juros na casa de 50% ao ano, vendas em baixa e desemprego crescente.

 

Nos últimos dois meses, a procura por crédito caiu até 40%, o uso do cheque pré-datado está perdendo força e os prazos máximos nessa modalidade de pagamento já caíram pela metade. O consumidor que tem dinheiro no bolso para negociar bons descontos na compra à vista pode conseguir abatimentos de até 10% no caso de eletrodomésticos.

 

O desconto no preço à vista, já captado pela deflação dos índices de custo de vida, era impensável até poucos meses atrás. As lojas praticamente impunham as vendas parceladas para assegurar uma entrada de recursos regular e usufruir ganhos financeiros. As lojas desprezavam o esforço do consumidor de pechinchar abatimentos.

 

“A partir de setembro, passamos a dar desconto na venda à vista porque a concorrência está privilegiando essa forma de pagamento”, afirma o supervisor-geral da Lojas Cem, Valdemir Colleone. A Lojas Colombo, com 245 unidades espalhadas pelo Sul, por exemplo, reduziu o número de itens das vendas a prazo feitas em até três vezes pelo preço à vista. De acordo com o diretor, Adelino Colombo, a decisão foi motivada pela subida dos juros, que tornou inviável essa forma de pagamento.

 

O emprésario diz que não seguia a prática que se espalhou pelo mercado de embutir no preço à vista os juros equivalentes ao período do parcelamento. Com isso, agora não consegue sustentar esse tipo de promoção para todos os itens vendidos na loja, limitando a oito ou dez produtos que funcionam como chamariz de vendas.

 

A Fast Shop, por exemplo, tem procurado abrir negociações com o cliente que compra à vista. “Quem bater o pé consegue baixar preços”, observa o diretor Júlio Kakumoto, preferindo manter em segredo os porcentuais de descontos. Com as altas taxas de juros cobradas para capital de giro é vantajoso para o lojista cortar preço e reduzir o estoque a ter de buscar financiamento nos bancos.

 

Mudança – Números da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) confirmam o predomínio dos negócios à vista no comércio. Em setembro, as consultas ao Telecheque, indicador dessa forma de pagamento, somaram 1,579 milhão, 20,65% acima dos registros recebidos para vendas a prazo. As consultas ao SPC, termômetro do crediário, fecharam setembro com 20,8% da marca atingida em outubro de 97, no início da crise asiática.

“A tendência é crescer a venda à vista e reduzir o prazo do cheque pré-datado porque a incerteza é muito grande”, diz o economista da ACSP Emílio Alfieri. Levantamento da Teledata, empresa especializada em garantir cheques, revela que, no mês passado, com o agravamento da crise, o pré-datado recuou para 59% do documentos garantidos. No mês anterior, a fatia dos pré-datados era de 62%.

 

O diretor de Marketing da Teledata, Sérgio Zacchia, destaca que, além da perda de importância do pré-datado, o prazo também caiu nos últimos meses. Em agosto, o prazo máximo chegava a 120 dias e, no mês seguinte, tinha recuado para 60 dias. “Com prazos mais enxutos, o risco diminui para o lojista e para consumidor”, diz Zacchia.

 

A pouca disposição de comprar e vender em prazos mais longos já tem reflexos nas carteiras de crédito das financeiras e dos bancos. A Cred/1, por exemplo, financeira do Banco Rendimento, registrou retração de 35% nas vendas financiadas em dois meses encerrados no dia 15 de outubro. Com uma carteira de R$ 80 milhões, o recuo é reflexo do receio do consumidor de perder o emprego, observa o diretor Mauro Wulkan. Com uma clientela de 400 lojas, a financeira teve queda nas operações nas cinco linhas de produtos com que trabalha. A maior queda ocorreu no crédito para compra de móveis, que foi de 40% no período.

 

Retração semelhante foi registrada pelo gerente-executivo do Banco do Brasil que cuida de empréstimos e financiamentos a pessoas físicas, Guilherme Meneguetti. “A queda foi provocada pela combinação do encurtamento dos financiamentos com juros elevados.” A redução dos prazos, explica, foi necessária para diminuir o nível de exposição de risco do banco


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